O preço que pagamos

domingo, 13 de junho de 2010


Criamos um mundo repleto de idéias. Criamos um mundo. Nossos ancestrais duvidavam de nossas capacidades, mas superamos suas expectativas. Somos bons cientistas. Já fomos bons descobridores de sete mares, hoje desvendamos mistérios em outros planetas. Há anos tentávamos apenas acender fogueiras com pedaços de pedras e algumas fagulhas junto à palha seca. Hoje, somos bons. Aprendemos que a ciência nos torna melhores. Acreditamos na ciência. Com ela, curamos enfermidades. Com ela criamos e desvendamos hipóteses. Aprendemos com ela a cada dia. Ela é como um nosso filho: a cada dia nos surpreende mais a medida em que o tempo passa. Ela não cresce como nossos filhos, mas nos enche de surpresas com seus avanços. Ela...ela...ela. Ela é um dos nossos vícios. Com ela aprendemos que somos poderosos. Conseguimos certa vez criar vida em laboratório e dar prosseguimento a ela. Nos sentimos verdadeiros deuses. Mas não o somos. Isso nos limita e nos entristece. Que pena tenho daqueles que se dizem poderosos por motivo da ciência. Nenhuma ciência existe na singeleza da flor. Ela não estudou nada para ser tão bela e importante. Nem por isso deixa de ser tão bela e importante. Caeiro tinha razão; as coisas são o que são mesmo.

Certa vez, vi homens no auge de suas autoridades negarem a existência de Deus, pois haviam descoberto certas coisas em seus laboratórios. Tristes, no fundo, com certeza, eram eles. Em meio a tantas de suas descobertas, nem mesmo sabem de onde vieram, nem muito menos para onde vão. Preferem dizer que de uma ‘’grande explosão’’ e ‘’para lugar nenhum’’. Respostas adequadas, pois não provam nada, não acrescentam nada, mas são respostas que calam o silêncio que viria após suas dúvidas e incertezas quanto a esses temas. Coitados de nós. Coitada da ciência.

Temos nos tornado a cada dia mais e mais materialistas. A ciência nos corrompe os princípios de humanidade, de pouco em pouco. Nos dizemos superiores aos outros animais. Nos achamos mais poderosos em relação a esse ou aquele país, bem como aos seus povos, pois conseguimos mandar satélites ou outros pedaços de metal para o espaço e deixa-los lá. Mas não conseguimos, na maioria das vezes, atravessar uma rua para consolar a tristeza e acalentar o frio de um humano dormindo, só e sem rumo, ao relento. Pobre ‘’mendigo’’. Mandamos naves espaciais tripuladas para visitar a lua, enquanto não conseguimos acabar com a fome em nosso mundo. Enviamos mensagens pela internet, por celulares, para quaisquer pessoas do planeta, mas não conseguimos ouvir as lamentações de alguém ao nosso lado, pois nunca temos tempo. Temos tanta tecnologia de última geração e de tanta utilidade que não nos sobra tempo para sermos simplesmente seres humanos. ‘’Humanos é o que vós sois’’, disse Chaplin. Somos sim, mas nos esquecemos de como é sê-lo, caro amigo Charlie. Aprendemos que podemos ver as pessoas do outro lado do mundo pela internet, ao vivo, em cores, mas somos cegos nos negando a ver todos os que sofrem ao nosso redor; todos os que passam fome e frio nas ruas, todos aqueles que alguns infelizes, pobres seres sem inteligência e sabedoria, dizem ser simples ‘’vagabundos’’. Somos vis. Somos maus. Somos inescrupulosos quando queremos. Somos céticos em muitas coisas, mas cremos na ciência, embora ela não nos pertença. Pertencemos a ela. Ela existe por si só, apesar de nossos esforços, de nossos cálculos, apesar de nós.

A natureza não usa números, não possui calculadoras para se fazer tão bela, tão imensa, tão superior a nós, pois somos apenas parte dela. Somos enganados por nós mesmos. Estamos criando uma multidão de céticos enganados por uma mentira vaga, vã; explicitamente vaga, implicitamente contestada. Estamos vendo, por debaixo de nossos tecnológicos óculos e de nossos naturais olhos, crescer uma juventude perdida. Não estamos fazendo nada por ela.

Nos nossos dias, jovens se perdem em meio às teclas dos teclados de seus computadores, em meio à tecnologia dos jogos, em meio às formas de comunicação via internet. Perdemos nossas famílias por motivo dos avanços da ciência. Tamanha a importância que damos a ela, a ciência, que perdemos nossas famílias por ela, e nada estamos fazendo para reverter esse quadro. Nossos jovens começam desde cedo a beber, voltam para casa bêbados, sedentos por amor dos pais, pelo colo das mães. Lembro de que há alguns anos isso ainda existia. Mas não! Criamos seres tecnológicos. Tecnologia não precisa de amor. Se nossos filhos choram, damos a eles jogos para que se alegrem. Se nossos filhos se drogam, os internamos para que novas drogas - desenvolvidas pela nossa ciência - os desintoxiquem. Se nossos filhos se sentem sós, damos a eles celulares, iPods, videogames modernos. Esquecemo-nos da sensação de darmos abraços, de darmos belos e sonoros ‘’bom dia’’. Esquecemo-nos de como é beijar nossos filhos antes deles dormirem e de abraçá-los para que não tenham sonhos ruins. Se nossos bebês choram, damos a eles CDs com músicas que tocam calmas e tranqüilas nas tecnológicas babás eletrônicas modernas. Somos fiéis desconhecedores de nossa raça, nossa raça humana.

Humanos é o que somos. Não somos máquinas, mas nos habituamos a elas e, com isso, nos tornamos parte delas. Somos infelizes corpos orgânicos que invejam os parafusos e chips das máquinas modernas. Queríamos ser como os computadores. Quando em dificuldades diante de um computador, deletamos coisas, desligamos os programas, recomeçamos. Na vida isso não é possível. Desaprendemos a errar e consertar erros, principalmente o último. Aprendemos a vida fácil dos jogos de simulação onde podemos errar e recomeçar ‘’do zero’’. Nas nossas vidas isso não é possível, por isso frustramo-nos. Pobres somos nós, pois cremos na mentira de que somos inferiores às máquinas, que elas nos derrotam. Não! Somos muito melhores que elas. Somos muito melhores, inclusive, em relação ao que somos hoje! Nos falta voltar à certeza da beleza da vida, à beleza dos abraços, dos beijos fraternais, dos ‘’bom dia’’, ‘’boa tarde’’, ‘’boa noite’’ da boa e velha vida humana, com ou sem computadores que nos espreitem. Somos melhores que isso, mas estamos dando mau exemplo aos nossos jovens.

Estamos criando uma multidão de descrentes na vida, de decepcionados homens e mulheres. Estamos vivendo e deixando um mundo de caos e desespero, de desapego para os nossos jovens, pois criamos ‘’verdades’’ mentirosas para pautarem nossas vidas, nossos hábitos, nossas ações e, principalmente, nossas desculpas e nossos erros. Fracassamos! Estamos criando uma geração inteira baseada nessas mentiras. Não podemos criticá-los, caso nossos filhos errem conosco ou errem com outros, pois os ensinamos a serem assim. Somos hipócritas e deixamos a hipocrisia como herança. Criamos nossos filhos junto às novas gerações entremeados a falsas expectativas, em meio às nossas falhas de comportamento, em meio aos nossos erros infindos. Falhamos!

Nossos filhos, apenas com muita sorte e com a proteção Divina, não irão cometer nossos erros, ou o que seria pior, cometer mais erros além dos nossos. Torçamos pela sorte. Torçamos pela proteção Divina. Torçamos por eles, nossos filhos. Afinal, esse é o preço que pagamos por mentir para a juventude.

Pedro GuiSaX

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